segunda-feira, 25 de agosto de 2008

Faça o que eu digo, não faça o que eu faço

Li, nos últimos tempos, artigos, matérias e coisas sobre a dificuldade ou falta de disponibilidade das pessoas para lerem textos longos. Não guardei os links de tudo, o que é uma pena, mas aqui dá para ter a idéia geral da coisa e algumas dicas de como prender o leitor a um texto online, como usar negritos, técnica que eu vejo cada vez mais por aí.

Não sei como é para os outros, mas eu também não me atraio por textos longos na internet (a coisa vem se transportando para livros, mas ainda não), e sei que não é por desconforto nos olhos ou algo assim. Não me incomodo em ler muitos textos pequenos, mas basta aparecer um mais longo que eu já penso duas vezes. Se tem muitos parágrafos, eu leio as primeiras dez linhas e só continuo se elas tiverem me prendido. Se forem meia boca, leio o resto por cima. Se forem medíocres, fecho na hora. Já com textos pequenos sou bem mais condescendente. Podem ser mal escritos e irrelevantes, eu leio tudo.

É péssimo, obviamente. Acho que não preciso dizer porque ter um repertório de dezenas de leituras ruins é pior que um repertório de poucas leituras boas. Claro que venho me forçando a reverter o hábito, mas não posso negar que houve essa fase e não consigo entender de onde veio.

Meu primeiro chute seria culpar a natural tendência humana a preferir tudo do jeito que exija menos esforços. Mas não vejo exatamente como isso explicaria a situação. Ler dezenas de textos curtos é tão ou mais trabalhoso que ler um comprido. Também não posso culpar a falta de tempo, já que o fenômeno acontece mesmo quando tenho tempo livre à disposição.

Esses dias me ocorreu que pode estar ligado ao desejo de terminar ou se livrar das coisas rapidamente. Lembro de um carnaval mais que chuvoso em que ficamos, cinco amigas, vendo o tempo passar dentro de um apartamento no morro da Silveira. No meio daquele tédio muito particular a dias frios na praia, tínhamos que fazer as coisas práticas - como abastecer a geladeira - e arranjar coisas divertidas que não resultassem em pneumonia. As obrigações a gente queria resolver o mais rápido possível, o que era de se esperar, mas logo a gente também entrou na loucura de fazer de uma vez o que deveria ser a parte boa do carnaval e então lá estávamos dizendo coisas como "a gente passa na padaria aqui em baixo pra comprar o queijo, depois abastece ali no centro e vamos pro Siriú, aí já mata essa".

Qualquer um que já tenha passado perto do Siriú sabe que não é um lugar que tu queira ir para poder riscar de uma lista e partir pra próxima. Tudo bem que estava chovendo horrores, que fazia frio e não tínhamos meias, que ventava e não levamos casacos, mas ainda assim. Não sei qual das duas coisas aconteceu: se no fundo não queríamos ir mas nos sentimos na obrigação porque era o plano inicial; ou se no fundo sabíamos que quando a gente chegasse lá seria legal mesmo que na hora parecesse altamente improvável aproveitar um dia de merda numa praia vazia.

Fato é que acho que essa filosofia de "matar essa" colabora um pouco com a vitória dos textos curtos sobre os textos longos. Quanto antes eu matar esse texto aqui, eu posso passar ao seguinte e assim por diante deixando pra trás um grande acúmulo de tarefas cumpridas. Talvez isso confira uma falsa sensação de maior produtividade ao dia, não sei.

O que me preocupa nisso tudo nem é tanto a postura dos leitores. Cada um que leia ou deixe de ler o que bem entender. Me preocupa o efeito que isso tem sobre os escritores. Quem escreve quer ser lido, não importa se pelos amigos mais chegados ou se pela massa, ninguém escreve quinze parágrafos na esperança de que o leitor pare lá pelo terceiro. Então é de se esperar (na verdade, já está acontecendo) que escritores que publicam na internet moldem seus textos ao formato que tem mais chance de angariar público.

O problema é que existe um limite do quão conciso, de quão scannable um texto pode ser até perder de vez o estilo. A autoria de um texto está muitas vezes naquilo que não precisa ser necessariamente dito, pelas regras da objetividade, mas que dão o tom, criam emoção, humor ou melodia. É o que difere um relato gonzo-jornalístico de uma notícia do Correio do Povo, só pra dar um exemplo. Temo um pouco que os textos na internet se tornem cada vez mais duros, apenas aglomerados de informações organizadas em listas ou parágrafos de nunca mais que quatro linhas.

9 comentários:

Unknown disse...

eu to lendo A ARTE DE ESCREVER, do schopenhauer, e ele fala algo sobre ser preciso na hora de dizer as coisas... eu me mijo rindo...

e, pra constar, e como tenho preguiça de ter um blogue, agora eu tenho um twitter.com/zenascimento

lsdfkjhgslkçdjfga...

luís felipe disse...

muito grande, não li.

luís felipe disse...

falando sério: uma das coisas que mais me irrita na internet é o comentário acima. Parece que as pessoas se ORGULHAM de não ler as coisas.

o texto na web está se adaptando aos poucos. Se descobriu, p.ex, que um ENTER entre um parágrafo e outro facilita muito a leitura na tela. Que letra branca em fundo preto é terrível na maior parte das situações. Alguns são radicais nisso tudo - no Blog do Juca Kfouri, p.ex, praticamente todas as frases são parágrafos.

Eu tenho dificuldades com a questão do hipertexto. Não consigo encher de links um texto meu, a menos que realmente queira que o leitor se informe a respeito do que estou falando. O Nova Corja, por exemplo, é um saco pra ler. Tanto pela linguagem como pelo excesso de vínculos. Eu sempre clico em no mínimo três deles e acabo nunca lendo um artigo inteiro.

Su disse...

Tb não tenho conseguido ler textos longos na net e já notei que minha atenção diminuiu muito para textos em papel. Livros consigo numa boa, no entanto algo mais técnico tranco e não consigo mais ir. Esses dias imprimi uma prova de um concurso para fazer e que sufoco ficar atenta só nela. E nunca tive problemas de concentração. tô tentando me educar mais na internet, terminar os textos longos que começo a ler e também não ficar trocando de tela durante a leitura. Problemas modernos...

Karine disse...

quem diria que um dia de merda em uma praia deserta poderia explicar as leituras na internet, né?
pior que faz todo o sentido.

hoje mesmo, eu estava pensando em algo parecido com isso. há dois dias, venho realizando de três a quatro tarefas na hora do almoço. percebi que me sinto muito melhor e, pasme, mais FELIZ, quando acumulo tarefas simples. se consigo realizar apenas uma, mesmo que mais importante e complicada, nesse mesmo intervalo de tempo, não me sinto tão bem. aliás, nem perto disso.

ah, e obrigada pela lembrança desse carnaval. me matei rindo.

Anônimo disse...

Gosto do que tu escreve.
Estou colocando um link daqui lá no meu blog ( http://maralanez.spaces.live.com ), tá?

Mara Lane (vó da Morgana)

Anônimo disse...

Vale dizer que o que é longo para a Internet muitas vezes é até bem pequeno para o papel, por ex.

Seja como for, escrevo textos "longos". Todas minhas tentativas de 'enxugar' a coisa foram pateticamente frustradas, de modo que simplesmente me conformei em ser inadequado para a Internet. Que jeito?... :P

Unknown disse...

pra que ter um blogue se eu não atualizo, né?!

Julia Dantas disse...

realmente gosto dos meus comentadores :) vocês trazem boas reflexões. agradeço.

Mara Lane, também gostei do que tu escreves, vou te linkar aqui ;)

zeh, o que passa é que às vezes tiro umas férias de mim. é muita convivência.